Entrevista com o professor André Luiz Piva de Carvalho

André Luiz Piva de Carvalho 

Prof. Dr. Adjunto III da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Coordenador do Programa de Pós-graduação lato sensu em Turismo e Desenvolvimento Local - UFPB. Doutorado em Cultura e Sociedade, linha de pesquisa em Cultura e Identidade, pela UFBA - Universidade Federal da Bahia (Faculdade de Comunicação). Mestrado em Ciências da Comunicação, área de jornalismo, pela ECA / USP. Cursos de pós-graduação lato senso: Metodologias do Ensino Superior (Unimar), Metodologias da Comunicação (UFPB) e Curso de Preparação à Magistratura (ESMA - PB). Graduado em Jornalismo, Relações Públicas e Direito. Experiência docente em diversas disciplinas de jornalismo, publicidade e propaganda, relações públicas e turismo. Experiência profissional em jornalismo sindical, político e turístico, relações públicas, publicidade, fotografia, artes gráficas, editoração, marketing, vendas, organização de eventos, elaboração de projetos acadêmico-científicos, inclusive para implantação de cursos de graduação e pós-graduação, e profissionais, especialmente em cultura e turismo. Coordenador de ações extensionistas da UFPB - Probex e Proext, com destaque para o Programa Paraíba Criativa.

 

1 – Como o sr analisa a trajetória da Universidade Federal Paraíba nesses 60 anos?

De grande sucesso, certamente. A UFPB é um patrimônio do Estado, contribuindo, em toda sua existência, para o desenvolvimento regional, com avanços contínuos, questão que acredito ser mais relevante destacar emseus 60 anos de história. Ou seja, a Instituição nunca deixou de crescer, ampliando suas instalações físico-estruturais, número de cursos, de graduação e pós-graduação, os trabalhos de pesquisa, extensão, oferta de vagas para os estudantes, orçamento, entre alguns outros pontos. Tal dinamismo levou a UFPB à necessidade de se reciclar em função de cada período histórico-social dos últimos 60 anos, de modo a atender aos anseios e novas configurações da sociedade de cada época, fato que implica em acompanhar mudanças tecnológicas, alterações políticas e econômicas, avanços sociais, considerando-se que tudo isso caminha de maneira interligada, exigindo adaptações, em especial, dos sistemas e ações educacionais que na UFPB, particularmente, nunca deixaram de acontecer, um legado, portanto, de enorme e incontestável valor para a Paraíba, o Nordeste e o País.

Como exemplo desse processo de avanço, conforme as necessidades da sociedade local, posso indicar minha particular experiência com nossa graduação em turismo, da qual tenho a satisfação de ser reconhecido, simbolicamente, como seu fundador, por ter sido o presidente de sua comissão de implantação, que trabalhou entre meados de 1996 e durante o ano de 1997. Na verdade, o projeto acadêmico do curso foi elaborado pelos professores Moacir Barbosa e Maria Auxiliadora Barbosa, enquanto eu cuidei das questões político-administrativas.

Nosso curso de turismo iniciou suas atividades em março de 1988, época em que diferentes setores da sociedade paraibana, pensando em favor do desenvolvimento regional, apontavampara a necessidade de se ter uma graduação em turismo, a qual já contabiliza uma bela história, uma reconhecida produção em ensino, pesquisa e extensão, sem pensar em parar. Já tivemos cursos de pós-graduação lato sensu e a stricto senso, o mestrado, está na pauta.

Claro que a história da graduação em turismo da UFPB é similar às das dezenas de outros cursos da mesma Instituição. Por isso, eu destacar que o dinamismo, o atendimento às demandas de períodos contemporâneos, as adaptações e as evoluções.

 

2 - Que futuro o sr vislumbra para a UFPB nos próximos 60 anos?

Conformeminhas palavras na resposta da pergunta anterior, creio que o dinamismo não pode deixar de ser umtraço marcante da UFPB, o que representa um desafio para todos, dirigentes, docentes, alunos e funcionários, de modo a se ter sistemas acadêmicos e administrativos compatíveis.

Entretanto, mediante o fato de nossa Universidade ser Pública, do Governo Federal, nunca me sinto tranquilo em relação ao futuro. Vivemos experiências negativas durante governos anteriores à presidência de Lula, períodos de estagnação, com maiores dificuldades estruturais para que nossa Universidade cumprisse seu papel histórico, de contínuo avanço, como eu já disse.

Posteriormente, com a chegada do Lula, houve um notório crescimento da UFPB, os números de cursos, aumento de vagas, ampliação de estruturas físicas, entre outros avanços. Mas, e agora? No atual momento em que o PT tanto decepcionou, mediante os casos de corrupção, que levaram o país à atual crise, que têm colocado o Governo Dilma em cheque?

Estamos em greve, de professores e funcionários. Creio que a quinta ou a sexta greve durante meus 27 anos de docência na UFPB. Uma contumácia que revela um problema crônico do Estado Brasileiro, não conseguir ter um sistema educacional realmente satisfatório. No caso, é completamente inadmissível a estrutura político-educacional que apenas contempla reivindicações dos docentes federais, justas, por sinal, conforme se evidencia em diversos quesitos, se houver greve.   

Contudo, em um olhar mais otimista, como eu sempre decidi por trabalhar, produzir além do mínimo exigido para minhas funções docentes, creio que há muitos outros docentes com o mesmo comportamento, o qual deve garantir, no futuro, a continuidade do histórico perfil da UFPB, delineado nos últimos 60 anos. 

 

3 – Como é para o sr fazer parte da história de uma instituição tão importante para a Paraíba e para o Brasil como a UFPB?

Motivo de orgulho, realmente, sem qualquer temor de que minha fala possa parecer automática ou suspeita, de modo a valorizar minha carreira profissional ou a própria UFPB.

Ministrar aulas para mim é um prazer, mas sempre atuei muito além das obrigações docentes obrigatórias, conforme meu currículo e relatório de atividades semestrais indicam, com algum esforço mais significativo na extensão universitária e em coordenações de cursos de especialização, pós lato senso.

E minha satisfação, derivada de 27 anos de atuação na UFPB, somente foi possível porque a Instituição me proporcionou oportunidades de fazer além do básico. Prerrogativa aberta a todos, docentes e discentes. Sempre digo aos meus alunos: “Queria eu, nos meus tempos de aluno de graduação, ter as oportunidades que hoje a Universidade proporciona a vocês, desde que queiram se esforçar um pouco mais, ficando antenado, de olho nas possibilidades.”
 

4 – Quais os maiores desafios que a UFPB tem pela frente?

O maior desafio é sobreviver às políticas educacionais do Governo Federal.Se nunca tivemos as condições de trabalho ideais, nestes momentos de instabilidade, computando que já estamos completando quatro meses de greve, as preocupações aumentam.

Por isso, a necessidade de trabalharmos com afinco, apresentar resultados profícuos, os únicos meios de termos o reconhecimento da sociedade sobre a relevância da Universidade Pública, o que leva à força necessária para resistirmos às políticas públicas que ameaçam o futuro da Instituição.
 

5 – Ao olharmos para o futuro, na sua opinião, o modelo de universidade pública vai mudar?

Creio que, conforme já também afirmei nas respostas anteriores, o dinamismo de todos os segmentos da Sociedade é contínuo, exigindo da Universidade constantes adaptações. Logo, as possibilidades de mudanças no próprio modelo generalista da universidade pública, no qual vejo muitas fissuras, que sugerem necessidades de alterações sim, sob pena de um dia a Sociedade entender que nosso trabalho é inócuo, inclusive sob acompreensão de que uma Universidade Federal é uma máquina de gastos do dinheiro dos contribuintes.

Claro que se houver mudanças não será de uma hora para outra, mas sim gradativamente, processo que poderá demandar um tempo mais longo. Difícil prever datas. Mas o indispensável é que a própria Universidade seja protagonista no processo, de modo que ela sempre seja ágil para atender às aspirações da Sociedade.

Por outro lado, devemos nos fazer mais presente aos olhos e vida da sociedade regional. Como?

A Universidade deve ter estratégias para mostrar de forma mais eficaz sua relevância. E não estou falando apenas de divulgação ou promoção midiática, apesar de tais recursos não poder ser dispensados. Sempre digo que nossa UFPB, por exemplo, é pauta muito mais contínua nas mídias locais na ocorrência de fatos depreciativos, a exemplos de greve, crimes nos campi, movimentos de protestos de estudantes, problemas estruturais, entre outros. Nada contra a mídia noticiar tais problemas, seja como cidadão e, em especial, como jornalista. Mas temos muito a mostrar de nossas ações que merecem sentidos enaltecedores na mídia, desde o trabalho das salas de aula, às pesquisas, os profissionais egressos da Instituição, a capacitação do corpo docente (o número de doutores na UFPB leva a Instituição a posições de lideranças), as ações extensionistas que beneficiam muitas comunidades, entre muitas outras realizações louváveis.

O que fazer além de empregar recursos midiáticos?

Abrir muito mais os muros da UFPB, em seus cinco campi, para a comunidade, com estrutura realmente atrativa no campo científico e artístico-cultural. Precisamos de museus em linguagens audiovisuais contemporâneas, muito mais atividades artístico-culturais dinâmicas e constantes, programas turístico-educacionais e esportivos, além de outras atividades.

Precisamos criar fatos, oferecer coisas concretas para que a população tenha a UFPB com presença mais significativa e real em suas vidas.

Também reputo enorme importância às ações extensionistas. Entendimento derivado de minha considerável atuação na área. Até peço licença para promover nosso Programa do Proext, “Paraíba Criativa: a cultura paraibana no mundo da economia criativa”, cujo portal eletrônico na web (www.paraibacriativa.com.br), mediante seu conteúdo, já se coloca entre os mais completos do país no segmento da cultura.

Considero a alta produção da UFPB, em termos quantitativos e qualitativos, na atividade de extensão, de todos os campi, e muitos cursos e setores, temos resultados muito compensadores. Logo, acredito que a extensão, já muito abrangente em nossa Instituição, contando com o reconhecido apoio da reitoria, deva ser cada vez mais incentivada. É o caminho mais aberto que temos para colaborar com as comunidades locais, demonstrar o potencial produtivo da Universidade.
 

6 - O senhor entende ser sustentável o recente processo de expansão das universidades brasileira?

As nuances relativas à expansão das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES) são muito complexas, com diversos pontos a ser considerados.

O histórico do país na área educacional, configurado por notórias deficiências e atrasos, revela que nunca tivemos políticas públicas adequadas para o setor. Por isso a necessidade de se procurar recuperar o tempo perdido, oferecer, cada vez mais, o ensino público e gratuito, com reconhecida qualidade. Assim, o aperfeiçoamento de nossos sistemas educacionais ser questão basilar, com ações mais efetivas em todos os níveis de ensino, do fundamental ao universitário.

Entretanto, aqui devo considerar que oaumento de cursos e vagas em cursos de terceiro grau é medida fundamental para a sociedade brasileira, afinalnão há como negar a relevância de se oferecer oportunidades de curso superior gratuito a um maior número de pessoas, fato que envolve questões relativas à cidadania e inclusão socioeconômica.

Há, portanto, muitos jovens e adultos que realizam seu projeto de vidaconcluindo os cursos de seus sonhos, qualificando-se para o mercado de trabalho conforme seu desejo.

Por outro lado, sabemos para uma enorme quantidade de pessoas interessa apenas a posse de um diploma de curso superior, independentemente de qual seja a graduação ou licenciatura. Há, no caso, muitos que nem pensam em trabalhar na área do curso, desejando apenas ter a formação superior em seu currículo. Creio que tal situação até que se justifica, considerando-se as emotividades particulares de quem opta pela situação, mas o que dizer de estudantes que se matriculam em cursos por não conseguir o acesso àquele que realmente lhe interessaria?

Como docente tenho enfrentado alguns problemas de alunos que se incluem na referida condição, grande parte deles sem disfarçar a frustração, evidenciando desinteresse pelas aulas e os respectivos conteúdos.

Também percebo a criação de cursos por motivações políticas e corporativistas sem se avaliar seu espaço no mercado de trabalho.

Lembro que nos últimos anos, não apenas na UFPB, foram construídos (havendo ainda obras em andamento) muitos prédios, amplas estruturas físicas, para se atender às necessidades de novos cursos. Assim, se há aqueles que visivelmente não proporcionam inserções no mercado de trabalho, qual será seu futuro? O que fazer, a médio e longo prazo com a estrutura física, salas e prédios que abrigam tais cursos?

Por último, devo dizer que cronicamente enfrentamos problemas em relação ao custeio de muitos cursos. Assim, de que adianta ter estrutura física se não houver recursos suficientes para livros, laboratórios, equipamentos para atividades práticas, entre outros insumos?

E o mais preocupante: a sustentabilidade das IFES depende das políticas públicas educacionais do Governo Federal, em momentos em que vivemos muitas incertezas.

Devemos, realmente, nos preocupar e, principalmente, agir.