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Desigualdade afeta acesso de mulheres a informações sobre HIV/AIDS

publicado: 04/08/2021 13h45, última modificação: 04/08/2021 14h49

Segundo dados da UNAIDS Brasil, cerca de 5 mil mulheres entre 15 e 24 anos são infectadas pelo HIV toda semana no mundo. No Brasil, estima-se que 330 mil mulheres vivam com a infecção viral. Ainda assim, as pessoas continuam associando o vírus aos extintos “grupos de risco”, que eram formados por homens gays, profissionais do sexo e usuários de drogas. Para Rosi Farias, coordenadora geral da ONG Cordel Vida, a associação ainda acontece por causa da descoberta do vírus ter ocorrido em homens gays e essa ideia ainda domina o imaginário coletivo. 

Rosi também acredita que o número alto de mulheres contaminadas pelo vírus seja ocasionado pela estrutura patriarcal da sociedade e pela falta de autonomia das mulheres. “O machismo impede que as mulheres negociem com seus parceiros o uso das tecnologias de prevenção para o HIV/AIDS por acharem que não podem contrair a doença nas relações estáveis ou com seus maridos”, afirma.

Dentro desse grupo, as mulheres trans são consideradas mais expostas à infecção por diversos fatores. “É uma população que tem mais dificuldade de acessar as políticas públicas efetivas, em qualquer esfera ou necessidade. Outro problema é o desrespeito e os constrangimentos a que são submetidas quando buscam algum serviço, principalmente na saúde, que não está preparada para o atendimento integral e não respeita as especificidades dessas mulheres”, argumenta a coordenadora.

De acordo com a professora Luziana Silva, vice-líder do Grupo de Pesquisa em Saúde, Sociedade e Cultura da UFPB (GRUPESSC), a desigualdade de gênero contribui para o aumento da exposição das mulheres em relação ao HIV/AIDS. “Por causa dessa perspectiva de um poder desigual em relação aos homens, há barreiras relacionadas a negociação do sexo seguro ou a própria violência sexual, que também é outro agravante que pode aumentar a exposição das mulheres em relação ao HIV”, explica. 

Aliados a desigualdade de gênero, estão os estigmas sociais que impedem as mulheres de buscarem tratamento ou o apoio de outras mulheres soropositivas. Os tabus acerca da doença fazem com que muitas mulheres enfrentem o diagnóstico e até o agravamento da doença solitariamente. “Tendo em vista que a forma de transmissão do vírus se dá, em sua maioria, pelas relações sexuais, isso faz com que mulheres busquem o tratamento tardiamente ou que não revelem sua sorologia por medo de serem apontadas como promíscuas ou sofrerem com os estigmas e preconceitos que infelizmente a doença ainda carrega”, afirma Rosi Farias.

Para diminuir a feminização da infecção, Rosi acredita que a educação em saúde com ênfase na prevenção dessa patologia, ainda é a melhor maneira de conscientização, com campanhas amplas e constantes que promovam a autonomia das mulheres sobre seus corpos.

A professora  e  coordenadora do GRUPESSC, Mónica Franch concorda que é preciso ampliar os debates acerca do assunto e fazer com que as informações cheguem às mulheres. “Os movimentos de mulheres são fundamentais para trazer essa compreensão e fortalecimento coletivo e individual. Onde as mulheres estiverem, ali tem de haver uma informação que seja sem medo, sem preconceito, acolhedora e uma troca de experiências”, reitera. 

Falando sobre AIDS

Pensando na necessidade urgente de popularizar o conhecimento acerca do HIV/AIDS, Mónica e Luziana coordenam o projeto “Falando sobre AIDS: debate e disseminação de informações sobre prevenir, viver e conviver com HIV/AIDS”, financiado pelo edital PROBEX 2021-2022. A atividade de extensão é resultado de uma trajetória de pesquisas em que elas, junto ao GRUPESSC, estão envolvidas desde 2007. “O que a gente percebeu nessa trajetória é que o espaço público para falar sobre HIV/AIDS tem se reduzido muito no Brasil contemporâneo”, avalia Mónica. 

A professora acredita que como o diagnóstico do HIV positivo não está diretamente ligado ao diagnóstico de morte como acontecia, principalmente, nos anos 1990 antes do uso dos antirretrovirais, há uma ideia equivocada de que a doença está sob controle. Esse pensamento é reafirmado pela falta de campanhas informativas e investimentos por parte do poder público. “Nós percebemos que precisávamos falar para além dos muros da universidade. Abrir o verbo para discutir as diferentes dimensões, não como profissionais da saúde que nós não somos, mas sim como pessoas que estudam essas dimensões do viver com HIV/AIDS”, conta. 

Para a antropóloga, falar sobre o HIV é também discutir sobre desigualdade de gênero, sexualidade e, principalmente, sobre o Sistema Único de Saúde (SUS). “Todas essas pautas não dizem respeito apenas a uma pessoa, mas a todos nós. [O silenciamento] faz parte de um processo que vai deixando a população desinformada e a gente percebe nas nossas pesquisas que, muitas vezes, as pessoas infectadas pelo HIV, não sabem que esse vírus ainda está circulando”, diz. 

Por isso, o intuito do projeto é disseminar informações sobre a prevenção, mas também sobre as experiências das pessoas que vivem com o HIV/AIDS. Embora o contexto social tenha mudado, e haja o direito ao tratamento gratuito pelo SUS, ainda persistem diversos preconceitos que tornam difícil para as pessoas encararem o diagnóstico da doença e, por consequência, seu tratamento. “Quando a gente foca somente na prevenção, esquecemos de quem está vivendo com o vírus e como é importante que a gente olhe de uma maneira sem preconceito, com solidariedade e na luta pelos direitos dessas pessoas”, enfatiza Mónica. 

Durante a pandemia, a atividade de extensão tem sido desenvolvida por meio das redes sociais. O grupo tem publicado informações relacionadas à prevenção e convivência com o vírus. No perfil do projeto (@falandosobreaids) é possível encontrar conteúdos sobre pesquisas desenvolvidas, conversas com convidados de gestão pública ou movimentos sociais e referências de filmes que tratam sobre a temática.  

Extensionista: Aléssia Guedes | Edição: Lis Lemos