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Mulheres discutem estruturas patriarcais no sertão paraibano

publicado: 22/07/2021 17h59, última modificação: 22/07/2021 17h59

“Ouvíamos que nossas atitudes estavam indo longe demais”, recorda Mirian Oliveira, 27, integrante do Coletivo Mulheres a Bessa. Em setembro próximo completa um ano do grupo criado para se manifestar sobre o feminicídio de Pâmela Bessa, em Poço de José de Moura, distante 410 km de João Pessoa. Na época, o coletivo fez protestos nas ruas e um ato na principal praça da cidade em articulação com mulheres de Cajazeiras, São João do Rio do Peixe e Triunfo. “Nossa cultura autoriza que homens cometam deliberadamente vários tipos de violência contra mulheres, temos altos índices de feminicídio e essas violações são tão constantes que foram naturalizadas”, comenta Mirian.

O Mullheres a Bessa exigia que o Estado se posicionasse frente ao caso e que a mídia o reconhecesse e veiculasse como um feminicídio. Além disso, o coletivo iniciou debates na cidade acerca das violências praticadas contra as mulheres. No entanto, elas enfrentam diversas dificuldades, inclusive  da própria comunidade em aceitar a atuação do grupo. “Quando começamos nossas ações nos vimos atadas de diversas formas: a falta de recursos, a inabilidade institucional, a sobrecarga de responsabilidades entre as mulheres, a ridicularização que partia da própria comunidade para nos conter e algumas parceiras não tinham o apoio familiar para prosseguir”, conta a jovem. 

Mirian argumenta que os estereótipos em torno do Sertão e a conjuntura política também são entraves para que haja discussões em torno das estruturas patriarcais. “Há uma política de empobrecimento do Sertão desde que este pedaço de chão foi nomeado, não ocorre apenas pela ridicularização da imagem, como também pela falta de recursos para que possamos estabelecer essas discussões”, explica. Ainda assim, o coletivo continua com reuniões pontuais e pretende começar um grupo de estudos. 

Atuação das mulheres na cidade de Patos 

Assim como em Poço de José de Moura, as mulheres movimentam as ruas de Patos, cidade localizada no sertão paraibano. O Movimento Olga Benário nasceu na 1ª Conferência Mundial de Mulheres de Base, realizada em Caracas, Venezuela, em março de 2011. Mas foi após o Seminário Nacional em João Pessoa que algumas mulheres atuantes em movimentos sociais foram contatadas para formar o núcleo na cidade do sertão paraibano. 

A assistente social Fernanda Oliveira, 30, conheceu o grupo em 2018, durante as eleições presidenciais. “Vi a atuação do Movimento em Patos e senti vontade de me organizar coletivamente diante das pautas que elas traziam", conta. Desde então, ela tem feito parte do grupo que atua em 19 estados do Brasil denunciando a exploração da população feminina, especialmente, da parcela mais empobrecida.

Fernanda conta que em uma sociedade capitalista e patriarcal é comum as pessoas pensarem que a organização de mulheres é algo simples e sem importância, mas não é. Principalmente, porque o grupo serve como espaço de apoio entre as integrantes. “Mulheres que começam a questionar as injustiças existentes na sociedade e começam a defender seus direitos também sofrem pressões em casa de seus familiares, de companheiros e até de filhos. Para não se sentirem frágeis, precisam do apoio e da presença de outras mulheres, não como um ombro amigo, mas como uma organização de proteção mútua e de luta”, enfatiza a assistente social. 

E quanto à atuação de coletivos e movimentos feministas no interior da Paraíba, Fernanda acredita que é um pensamento em ascensão. “Apesar dos obstáculos enfrentados, existe uma compreensão dos espaços a serem ocupados, principalmente na política”, avalia. 

No entanto, para ela ainda há muita resistência por parte das mulheres em aderir a luta por direitos e contra as violências de gênero. “O machismo ainda está enraizado, o sistema patriarcal ainda é muito forte, e isso faz com que as mulheres acabem naturalizando algumas situações, como violência doméstica, abusos ou retirada de direitos, por exemplo”, analisa.  

Com a pandemia, algumas atividades práticas do grupo ficaram limitadas, mas Fernanda afirma que elas continuam planejando projetos e parcerias, além de permanecerem convocando outras mulheres para fazerem parte do movimento. “Hoje, vejo a importância de estarmos nesses espaços, organizando mais mulheres a lutarem pelos seus direitos em um sistema tão opressor”, finaliza. 

Grupos como o Coletivo Mulheres a Bessa e o Movimento Olga Benário mostram como a organização feminista é também espaço de acolhimento para as mulheres e reforçam a necessidade da interiorização de pautas que desnaturalizam violências estruturais de gênero.

Extensionista: Aléssia Guedes | Edição: Lis Lemos