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Streamers enfrentam machismo no universo gamer

publicado: 06/08/2021 15h17, última modificação: 06/08/2021 15h17

“No meu primeiro dia de stream, enquanto fazia divulgação após uma partida, um dos jogadores começou a me insultar. Sofri gordofobia, racismo e insultos com as piores palavras que possa imaginar. Ele me disse que eu não deveria estar jogando, apenas pelo fato de eu ser uma mulher”, relata Laura Cavalcante, mulher preta e streamer há três anos.

O desabafo de Laura ilustra o que pesquisas nessa área já apontam. Esse ano, a Reach3 Insights, em parceria com a Lenovo, desenvolveu uma pesquisa em nível mundial e mostra que 77% das mulheres gamers enfrentam alguma situação desconfortável por conta de seu gênero. O julgamento de habilidades (70%), controle (65%) e comentários condescendentes (50%) são as violências mais recorrentes.  

Além disso, a pesquisa também aponta que 59% das mulheres entrevistadas usam identificação de gênero masculino ou não identificam o seu gênero para se resguardar do assédio durante os jogos. Essa já foi uma realidade pensada pela gamer.  "Eu já pensei em usar um nickname (Nome para identificar jogadores e jogadoras) masculino".  Para ela, persistir é uma maneira de manter viva a representatividade e voz das mulheres no mundo dos e-sports (modalidade esportiva eletrônica).

“Eu sempre tentei manter meu pensamento de que eu não poderia me esconder, que se eu me escondo, estou permitindo que eles me reprimam, e eu não consigo deixar isso acontecer. Esse é um dos motivos que me faz continuar fazendo stream: para mostrar para as meninas que a gente não deve se esconder por um nome masculino e sim pegar nosso lugar de direito seja onde quisermos”, defende convicta.

Assim como Laura, a jornalista Amanda Galdino, streamer desde 2019, também passou por situações machistas. Ela conta que um dos jogos que mais costumava acessar era o League of Legends (jogo eletrônico de batalha em que duas equipes se enfrentam para destruir a base adversária), mas decidiu transmitir o jogo com menos frequência em suas lives em decorrência do machismo, preferindo mais interação com o público feminino. 

“A gente tem vários escândalos nesse cenário o tempo todo. Esses jogos online, que são jogos de time que têm uma interação comunicativa com pessoas aleatórias, acabam sendo usados para cobrança. A forma como você é cobrada e julgada quando é mulher é diferente’, avalia. Atualmente, a jogadora prefere jogos indies com temática LGBTQIA+ e lançou o quadro ‘Bar das Streamers’, onde convida outras mulheres para conversar e jogar, mantendo assim uma maior interação com outras jogadoras. 

Resistência streamer feminina

Mesmo diante da cultura machista, as mulheres têm encontrado uma maneira de lutar e resistir. Segundo a Pesquisa Game Brasil (PGB), realizada em 2021, as mulheres representam mais de 50% do público de jogos eletrônicos, sendo maioria entre a comunidade gamer.

A jornalista e streamer Gi Ismael vem ocupando esse espaço. Em maio deste ano, iniciou sua produção na Twitch (plataforma exclusiva para live streams), com o canal ‘Gi com Tônica’. “Como ainda é muito recente para mim de fazer stream, ainda não passei por nenhuma violência, mas isso não significa que não existe machismo nesse ambiente. O que tenho visto é um senso de comunidade muito legal na Twitch, que é a plataforma que eu uso. Nos jogos que jogo, como o Counter Strike, frequentemente têm alguns comentários homofóbicos entre os jogadores e quando há um episódio desses, a comunidade se junta para expulsar a pessoa do game", relata.

Para a paraibana, o crescimento feminino nesse espaço a ajuda a se sentir fortalecida em trilhar esse caminho com outras mulheres. “O espaço do CCGO é muito ocupado por mulheres incríveis, que sempre estão no topo das partidas, então tenho me sentido muito confortável nesse ambiente de streamer. Eu acredito que esses espaços sendo ocupados, estimulam mais pessoas a ocupar também. Na maioria das vezes, o público que me assiste é masculino, então quando aparece uma mulher no meu canal acho incrível e já falo: amiga, vamos jogar”, diz entusiasmada.

Laura Cavalcante também avalia como positivo o apoio de outras mulheres. Após os ataques sofridos, a gamer passou a fazer parte da Wakanda Streamers, uma iniciativa que reúne, integra e impulsiona a comunidade preta de jogadores. “Procurei a Wakanda depois do primeiro ataque  que sofri. Lá eu tive amor, acolhimento e o sentimento de pertencer a algum lugar'', assegura. 

Ela elucida como  esse fortalecimento tem ajudado a quebrar essas estruturas e tem se sentido inspirada a resistir a esse cenário desafiador junto a outras mulheres. “É muito difícil lidar com essas coisas, mas a cada dia que passa vem também muita gente elogiando meu trabalho e falando que sou uma das poucas mulheres pretas que conhecem como streamer e isso me motiva a continuar”, garante.

Extensionista: Crislaine Honório | Edição: Lis Lemos