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Pesquisador da UFPB desvenda “DNA” do cimento Portland, o mais usado no mundo

Estudo foi publicado no periódico de maior fator de impacto do planeta na área
publicado: 01/08/2020 00h10, última modificação: 03/08/2020 20h04
Pesquisa permitirá melhoria do cimento Portland e redução de seu impacto ambiental. Crédito: William Fernandes

Pesquisa permitirá melhoria do cimento Portland e redução de seu impacto ambiental. Crédito: William Fernandes

O pesquisador da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), William Fernandes, desvendou o “DNA” do cimento Portland. O aglomerante hidráulico é o mais usado no mundo. O estudo foi publicado no periódico Cement and Concrete Research. A revista científica tem o maior fator de impacto do planeta na área de conhecimento.

O trabalho demonstrou, pela primeira vez, um modelo de estrutura atômica capaz de indicar onde os elementos químicos estranhos advindos de combustíveis alternativos se distribuem nas moléculas de um dos principais compostos químicos do cimento.

“Em outras palavras, identificamos alterações causadas no “DNA” do cimento pelo uso desses combustíveis. Com esses resultados, a análise minuciosa da estrutura do cimento pode ser feita, ajudando a entender as propriedades, o desempenho e aspectos de durabilidade de cimentos”, afirma o pesquisador.

Segundo o também engenheiro civil da Superintendência de Infraestrutura da UFPB, o estudo é fruto da estratégia de aplicar ciência básica ao desenvolvimento econômico sustentável industrial. Nesse caso específico, trata de como os combustíveis alternativos usados na fabricação do cimento Portland influenciam sua química e desempenho.

O achado só foi possível devido à utilização da radiação sincrotron, produzida ao acelerar elétrons em um túnel circular, mais ou menos do tamanho de um estádio de futebol, no vácuo e a uma velocidade próxima à da luz; preparação de rigorosa de amostras em ambiente industrial; utilização de técnicas avançadas e análise interdisciplinar da UFPB; e parceria internacional para o uso da radiação sincrotron.

“A luz sincrotron é gerada em um túnel circular, depois desviada para estações ao redor desse túnel, que a utilizam para fazer vários tipos de análises. Devido ao seu altíssimo brilho, milhares de vezes superior ao do sol, é possível medir com muita precisão as posições dos átomos dentro dos compostos químicos que formam diferentes materiais”, explica o pesquisador.

A pesquisa está sendo desenvolvida no Laboratório de Tecnologia de Novos Materiais (Tecnom), localizado no Centro de Tecnologia da UFPB, no campus I, em João Pessoa. O laboratório é um dos que constituem o Instituto UFPB de Desenvolvimento da Paraíba (Idep).

O trabalho conta com parceria da Indústria Elizabeth Cimentos e de uma pesquisadora colaboradora do Departamento de Química da Universidade de Edimburgo, no Reino Unido. Os dados de sincrotron foram coletados no Diamond Light Source, instalação científica nacional de fontes de luz sincrotron do Reino Unido, localizada no Harwell Science and Innovation, campus Oxfordshire. Algumas outras análises complementares foram feitas na Universidade de Edimburgo, durante período de doutorado sanduíche do pesquisador. 

Redução do impacto ambiental

De acordo com William Fernandes, o cimento é o segundo material mais consumido pelo homem, atrás apenas da água. Segundo ele, há uma forte pressão mundial para redução do impacto ambiental intrínseco da Indústria de Cimento Portland. Uma das principais estratégias para essa redução advém do uso de combustíveis alternativos, tais como o coque e derivados de petróleo, biomassa e resíduos da indústria polimérica, por exemplo.

“A forma como esses combustíveis afetam a química do cimento ainda não é bem conhecida. Além disso, reproduzir em laboratório toda a complexidade do cimento feito pela indústria não é tarefa simples, por isso a necessidade de haver parcerias fortes com a indústria, bem como o uso de equipamentos de análise microestrutrual de alta resolução e radiação sincrotron”, justifica.

“Esse modelo que construímos é o primeiro que leva em consideração os elementos químicos presentes nas impurezas dentro da estrutura atômica dos componentes do clínquer, principal matéria-prima artificial do cimento. Esse estudo vai permitir avanços no entendimento e processamento de resíduos pela indústria de cimento, aumentando a sustentabilidade do processo com garantia da melhoria do produto e redução do impacto ambiental”.

O modelo criado, já incorporado na rotina de controle de qualidade da Elizabeth Cimentos, representa de forma mais completa o principal composto químico que confere maior quantidade no cimento por ser o maior responsável pelo ganho de resistência nas pequenas idades, o silicato tri-cálcico.

Além disso, conhecendo as alterações causadas por elementos químicos no “DNA” do cimento, será possível manipulá-lo para aprimorar suas propriedades sem prejuízo aos aspectos de durabilidade e ambientais.

As amostras do estudo continuam sob análise no Tecnom-Idep, no sincrotron do Reino Unido e na Universidade de Edimburgo, sendo matéria de outros projetos de pesquisa da UFPB. Nesses trabalhos, continua-se a observar os efeitos dos combustíveis alternativos na hidratação ao longo de vários anos.

“Desde o ano passado, nosso grupo de pesquisa tem realizado reuniões com cientistas responsáveis pelo Sírius, o sincrotron brasileiro que está em processo final de instalação em Campinas/SP, com o objetivo de realizar estudos ainda mais avançados usando os recursos dessa potente instalação científica de última geração”, revela William Fernandes .

O trabalho é resultado da tese do pesquisador, orientada pelo professor Sandro Marden Torres, do Departamento de Engenharia Mecânica e coordenador do Tecnom-Idep da UFPB. Teve também a participação da professora Caroline A. Kirk, do Departamento de Química da Universidade de Edimburgo, no Reino Unido; dos professores da UFPB Antônio Leal e Marçal Lima Filho e do Degmar Diniz, diretor técnico da fábrica de cimento Elizabeth na Paraíba.

O trabalho contou com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), do Programa Institucional de Internacionalização (Capes – PrInt), do Science and Technology Facilities Council (STFC), da Companhia de Eletrificação do Vale do São Francisco (Chesf) e do Grupo Elizabeth - Divisão de Cimentos Ltda.

Os interessados em pesquisas sobre esse tema ou no desenvolvimento de estudos com aplicação de ciência a desenvolvimento de tecnologias industriais devem procurar a coordenação do Tecnom-Idep da UFPB, pelo e-mail sandromarden@ct.ufpb.br.

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Reportagem e Edição: Pedro Paz
Ascom/UFPB