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Reformas em habitações sociais comprometem conforto térmico e saúde de moradores, diz estudo da UFPB

publicado: 18/08/2021 13h00, última modificação: 18/08/2021 13h16
Foram avaliadas 99 moradias nas comunidades do Gadanho e do Timbó, em João Pessoa

Foto: Gianna Simões

Estudo do Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo (PPGAU), do Centro de Tecnologia da Universidade Federal da Paraíba (UFPB), aponta que remodelações e adaptações em habitações sociais comprometem conforto térmico e saúde dos usuários. Artigo com os principais resultados da pesquisa foi publicado em 1º de agosto deste ano, na Revista Building and Environment, periódico internacional de alto impacto na área científica.

Segundo a avaliação, realizada em 99 moradias nas comunidades de habitação social do Gadanho e do Timbó, em João Pessoa, entre 2017 e 2020, a remodelação aumentou a necessidade do uso contínuo de ventiladores para 87,9% dos moradores. Por causa da remoção de aberturas de janelas em 45,5% das habitações, expansões não planejadas muitas vezes culminaram em ambientes confinados ou muito quentes.

No total, 47,5% das construções analisadas reduziram as áreas de aberturas das fachadas, que fazem a comunicação com o ambiente externo. O grau de desconforto térmico interno dos moradores foi de 78,8%. Em média, as temperaturas do ar no interior dos imóveis variaram entre 29°C e 30,2°C, quase 4°C acima do recomendado, que é de 26°C, no máximo.

A pesquisa dividiu a amostra em dois grupos, casas que apresentam média de temperatura do ar menor que 29.5°C e maior que 29.5°C. No segundo grupo, foram encontrados os piores resultados em relação a variáveis térmicas, como altas temperaturas, baixa velocidade do ar (imperceptível para os usuários) e baixa umidade relativa do ar. Além dos domicílios serem muito quentes, também há ambientes confinados, escuros e com mofo, pois não recebem iluminação e ventilação natural.

Um representante de cada habitação foi entrevistado. O desconforto só está sendo sentido após as reformas. Ainda assim, afirmam que as alterariam em busca de mais espaço e de outras melhorias. Dessa forma, abusam do uso de ventilador e permanecem nas calçadas e ruas, esperando o calor diminuir. Outras estratégias adaptativas são, por exemplo, beber água fria e tomar banho gelado.

“Este é o primeiro de uma série de artigos como resultado do meu mestrado, defendido em 2018, sobre as habitações sociais das comunidades Gadanho e Timbó, entregues em 2013. Haverá ainda análises sobre adaptação espacial, consumo de energia e adaptação comportamental. Parte dos trabalhos está sendo feita no meu doutorado, em curso neste momento”, explica Gianna Simões, autora principal do artigo, sob orientação da professora Solange Leder. A docente Lucila Labaki, da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), é coautora.

O próximo passo do estudo é ampliar a pesquisa para as comunidades de Taipa Nova Vida e da Ilha do Bispo, também em João Pessoa, e adicionar a análise do consumo de energia, que não ocorreu durante o mestrado da pesquisadora e foi adicionada agora, no doutorado.

“Assim será possível ter um panorama amplo e detalhado com cinco tipos arquitetônicos diferentes, em quatro conjuntos habitacionais, que representam os tipos arquitetônicos mais comuns produzidos na cidade. Há pouca diferença no que é produzido na escala nacional, pois o programa é o mesmo, com dois quartos, salas, cozinha e sanitário”, afirma Gianna Simões.

Remodelações indicam falta de planejamento técnico e afetam qualidade de vida de famílias de baixa renda. Foto: Gianna Simões

Ambos os conjuntos habitacionais foram construídos para suprir a necessidade de novas habitações para populações de baixa renda que vivem em áreas de risco em razão de deslizamentos de terra e inundações de rios. As obras foram realizadas pelo Programa de Subsídio à Habitação de Interesse Social (PSH), em parceria com a prefeitura local.

Produção em massa

Para a pesquisadora e arquiteta Gianna Simões, o problema das habitações sociais se deve à produção em massa, sem considerar os diferentes tipos familiares. “Uma família com dez pessoas recebe a mesma casa que um idoso ou um casal sem filhos. Por isso os moradores são ‘forçados’ a se adaptarem à moradia ou, quando o orçamento familiar permite, adaptar a casa com as reformas necessárias”, esclarece.

Contudo, segundo ela, as reformas acontecem sem orientação técnica. São realizadas expansões que confinam os ambientes, com retiradas de janelas e outras aberturas para ventilação, e a tendência é de ocupação total do lote. Nesse contexto, o conforto térmico é prejudicado, além das condições de saúde. Isso faz com que as famílias busquem estratégias adaptativas.

Na avaliação da doutoranda, considerando que são famílias de baixa renda, o uso do ventilador ao longo de todo um dia, como tentativa de amenizar o desconforto térmico, passa a ser um fardo para essa população.

“Ambientes sem iluminação e ventilação natural, com mofo, que exigem ventilador por muitas horas ao longo do dia, e lâmpadas acesas de dia. Muitos vivem de reciclagem, poucos com trabalho formal, ou estão desempregados ou vivem de auxílios governamentais”, destaca a pesquisadora.

Na concepção da doutoranda, o tipo arquitetônico geminado (casas ligadas umas às outras) é a pior solução de construção. Gianna Simões acredita que é necessário integrar a população durante a elaboração do projeto, criar casas com diferentes tipos e tamanhos variados, tendo em vista a quantidade de moradores, o que evitaria tantas expansões desordenadas que acabam piorando ainda mais as condições térmicas internas.

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Reportagem: Pedro Paz
Edição: Aline Lins
Fotos: Gianna Simões